segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Revela-te


(“Por ser encantado, o amor revela-se” - Djavan)

Dediquei-me a um acróstico escrever,
Mas no dicionário, teu nome não encontrei.
Os livros antigos insistiam em esconder,
À ela em segredo, o que entre letras revelei.

As constelações se encheram de ciúmes,
Mesmo a lua, diante da beleza se escondeu.
Cantada em verso e prosa até os cumes,
ou num silencio de um vale, sentimento que nasceu.

Não haviam batizado uma estrela,
sequer homenageado uma flor.
Era nome tão intimo e belo, que revelaria o amor.

Nem nos sagrados textos estava,
Nem título dava a canção.
O nome misterioso estava gravado no coração.

terça-feira, 10 de abril de 2012

O jasmim

O encanto surgiu de repente,
da mais singela das flores.
Esperança renova e se sente,
renascer suspiros de amores.

Seu perfume exalado no ar,
traz a paz que ilumina e abençoa.
Sua candura fiel a inspirar,
seu sorriso nos ares ecoa.

A pura semente lançada,
bem cuidada, com fé, germinou,
na rocha, a dama da noite brotou.

O brilho da estrela desperta
e anuncia seu desabrochar,
e abre o coração, pro raro gosto do amar.

Víscera

Joguei fora meu coração.

Joguei fora meu coração,
não porque não batesse mais,
mas por causa das desilusões.

Coração é músculo, é víscera,
tripa, pedaço de carne.
Pulsa, é verdade, mas é
só um pedaço de carne,
Conjunto de tecidos, células...

Joguei fora por não me interessar mais
(ainda que a vida me interesse).

Joguei fora meu coração
pois, só cumpria sua função de bater.
E bate, quase sempre, forte.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Vitória Rara

dedicada a Victor Jara

Ouviu-se um clamor no Estádio Nacional,
Mas não era um grito de gol. Era a voz dos
que não se entregaram, ainda que cercados.
Não se acuaram ante ao inimigo, e contidos,
e amontoados, eram conduzidos ao vestiário
para serem massacrados (talvez o inside tenha
vindo de algum assessor alemão,
veterano das SS, que exclamou de pronto:
_ Os chuveiros. Mein gott, os chuveiros!)

O augusto representante do império
com suas armas e legiões, não poupou
sua voz valente, seu corpo e emoções.
Infligiram toda dor que podiam,
trucidaram suas falanges, mas não derrotaram
seu espírito inquebrantável.
Com as mãos moídas, os fascistas gritavam:
_ Toca! E lhe puseram um violão.
E qual foi sua resposta: _ Eu não toco pra vilão,
Toco pro povo insurgente, meu som é revolução.

Daniel Braga & Daniel Oliveira

quarta-feira, 14 de março de 2012

Dia nacional da poesia

O dia 14 março é chamado "O Dia Nacional da Poesia" e foi escolhido por ser a data de nascimento do grande poeta e lutador do povo, Castro Alves.

Como forma de homenageá-lo, segue um dos seus maiores poemas.

Vozes d'África

Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?
Em que mundo, em qu'estrela tu t'escondes
Embuçado nos céus?

Há dois mil anos te mandei meu grito,
Que embalde desde então corre o infinito...
Onde estás, Senhor Deus?...

Qual Prometeu tu me amarraste um dia
Do deserto na rubra penedia
- Infinito: galé! ...

Por abutre - me deste o sol candente,
E a terra de Suez - foi a corrente
Que me ligaste ao pé...
O cavalo estafado do Beduíno
Sob a vergasta tomba ressupino
E morre no areal.

Minha garupa sangra, a dor poreja,
Quando o chicote do simoun dardeja
O teu braço eternal.
Minhas irmãs são belas, são ditosas...
Dorme a Ásia nas sombras voluptuosas
Dos haréns do Sultão.

Ou no dorso dos brancos elefantes
Embala-se coberta de brilhantes
Nas plagas do Hindustão.

Por tenda tem os cimos do Himalaia...
Ganges amoroso beija a praia
Coberta de corais ...
A brisa de Misora o céu inflama;

E ela dorme nos templos do Deus Brama,
- Pagodes colossais...
A Europa é sempre Europa, a gloriosa! ...
A mulher deslumbrante e caprichosa,
Rainha e cortesã.

Artista - corta o mármor de Carrara;
Poetisa - tange os hinos de Ferrara,
No glorioso afã! ...
Sempre a láurea lhe cabe no litígio...
Ora uma c'roa, ora o barrete frígio
Enflora-lhe a cerviz.
Universo após ela - doudo amante
Segue cativo o passo delirante
Da grande meretriz.


Mas eu, Senhor!... Eu triste abandonada
Em meio das areias esgarrada,
Perdida marcho em vão!
Se choro... bebe o pranto a areia ardente;
talvez... p'ra que meu pranto, ó Deus clemente!
Não descubras no chão...
E nem tenho uma sombra de floresta...
Para cobrir-me nem um templo resta
No solo abrasador...
Quando subo às Pirâmides do Egito
Embalde aos quatro céus chorando grito:

"Abriga-me, Senhor!..."

Como o profeta em cinza a fronte envolve,
Velo a cabeça no areal que volve
O siroco feroz...
Quando eu passo no Saara amortalhada...
Ai! dizem: "Lá vai África embuçada
No seu branco albornoz. . . "
Nem vêem que o deserto é meu sudário,
Que o silêncio campeia solitário
Por sobre o peito meu.

Lá no solo onde o cardo apenas medra
Boceja a Esfinge colossal de pedra
Fitando o morno céu.
De Tebas nas colunas derrocadas
As cegonhas espiam debruçadas
O horizonte sem fim ...
Onde branqueia a caravana errante,
E o camelo monótono, arquejante
Que desce de Efraim

Não basta inda de dor, ó Deus terrível?!
É, pois, teu peito eterno, inexaurível
De vingança e rancor?...
E que é que fiz, Senhor? que torvo crime
Eu cometi jamais que assim me oprime
Teu gládio vingador?!

Foi depois do dilúvio... um viadante,
Negro, sombrio, pálido, arquejante,
Descia do Arará...
E eu disse ao peregrino fulminado:
"Cão! ... serás meu esposo bem-amado...

- Serei tua Eloá. . . "

Desde este dia o vento da desgraça
Por meus cabelos ululando passa
O anátema cruel.
As tribos erram do areal nas vagas,
E o Nômada faminto corta as plagas
No rápido corcel.
Vi a ciência desertar do Egito...
Vi meu povo seguir - Judeu maldito -
Trilho de perdição.
Depois vi minha prole desgraçada
Pelas garras d'Europa - arrebatada -
Amestrado falcão! ...

Cristo! embalde morreste sobre um monte
Teu sangue não lavou de minha fronte
A mancha original.
Ainda hoje são, por fado adverso,
Meus filhos - alimária do universo,
Eu - pasto universal...

Hoje em meu sangue a América se nutre
Condor que transformara-se em abutre,
Ave da escravidão,
Ela juntou-se às mais... irmã traidora
Qual de José os vis irmãos outrora
Venderam seu irmão.

Basta, Senhor! De teu potente braço
Role através dos astros e do espaço
Perdão p'ra os crimes meus!
Há dois mil anos eu soluço um grito...
escuta o brado meu lá no infinito,
Meu Deus! Senhor, meu Deus!!...


São Paulo, 11 de junho de 1868